Dizem que um sacerdote nunca vai sozinho para o céu – nem para o inferno. Ele carrega nas costas a responsabilidade das almas que contam com o seu ofício de pastor.

Raymond Leo Burke, além de sacerdote, é cardeal. Por isso, o peso das almas o afeta mais ainda. Pior: é cardeal numa época em que a Igreja enfrenta o seu mais poderoso inimigo – os esfumaçados comunistas – que, por algum buraquinho, penetrou no seio da Igreja.

O peso de tanta responsabilidade, entretanto, não conseguiu roubar dele a simplicidade e o bom humor. Parece que a  simplicidade e a envergadura intelectual andam juntas. Dizem que o pai da filosofia dizia: Só sei que nada sei. (Pobre Sócrates! Se soubesse que ia ser protagonista de tantas histórias, acho nunca teria se metido com a filosofia.) Uma coisa leva à outra: a sabedoria à simplicidade, a simplicidade ao bom humor. O bom humor vem da certeza de termos um Pai que é amor e que, mesmo nas piores enrascadas em que nos metemos – seja por culpa de terceiros ou, pior ainda, por nossa própria culpa – está sempre velando por nós.

Durante os três dias em que tive o imenso e imerecido privilégio de ser seu motorista na cidade de São Paulo, pude ver um homem que, mesmo sob o peso de tanta responsabilidade, consegue manter a serenidade e o bom humor.

Por exemplo: numa ocasião, falando de improviso, foi ajudado por uma tradutora que ia traduzindo parágrafo por parágrafo as palavras de Sua Eminência. Entretanto, os parágrafos foram se alongando e a professora teve dificuldade em um ou outro ponto. O Cardeal não se fez por rogado e disse que logo ia concluir e “parar de torturar” a tradutora.

Em outra ocasião, tomando café da manhã, ele e os acompanhantes eram fotografados por um japonês munido de um celular. Muito argutamente, observou que antigamente – antes do advento dos smartphones – os japoneses eram mais facilmente reconhecidos à distância porque andavam sempre com câmeras fotográficas a tiracolo. E contou a história de um sacerdote japonês que, durante um evento público, pediu algumas palavras em japonês em atenção à mãe dele presente na platéia. Após o discurso de Sua Eminência, mãe do sacerdote chorava e o Cardeal Burke ficou na dúvida se era de emoção ou de tristeza pelo mau japonês dele.

Em inúmeras ocasiões, fui testemunha da atenção que ele dava às inúmeras pessoas que o abordavam e da alegria com que as contagiava.

Finalmente, na cerimônia de autógrafos no lançamento do livro em São Paulo, ao chegar a minha vez de receber a dedicatória, Sua Eminência achou graça quando pedi que ele dedicasse o livro “ao motorista”.

Homem de riso fácil, sempre pronto a ver o lado alegre das coisas.

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