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O que mais me impressionou no discurso da vitória de Trump não foi propriamente o discurso mas os instantes que o precederam. Quando desceu as escadas de acesso ao palco, Donald Trump tentou sorrir mas a emoção transformou o sorriso em um quase-choro. Que sentimentos tomaram conta do homem de 69 anos que, sem nunca ter ocupado um cargo público, lutou sozinho contra todo o sistema político e contra toda a mídia de massa pelo cargo mais cobiçado da nação mais importante do mundo?

Talvez a sua cara de choro fosse o resultado de uma campanha extenuante, do momento seguinte a um grande esforço continuado, quando finalmente os músculos se distendem e o corpo dá mostras da tensão acumulada durante dias e mais dias de angústia e trabalho. Talvez finalmente acusasse os inúmeros golpes baixos usados contra ele, golpes tão baixos que saíram pela culatra.

Talvez pensasse em sua família, que, instantes mais tarde, citaria no discurso – em seus pais, em seus irmãos, em seus filhos. Talvez lhe viesse à mente os casamentos fracassados. Uma união desfeita é como duas folhas de papel bem coladas que posteriormente são separadas. Ninguém sai inteiro de uma experiência dessas.

Talvez pensasse na sua carreira, no longo caminho percorrido durante décadas e que naquele momento atingia o mais alto ponto na vida pública americana. Talvez se lembrasse dos sucessos e das derrotas, do dinheiro e da falta dele, dos parceiros e dos traíras.

A sua cara de choro talvez fosse consequência de estar ouvindo o hino nacional, música que sempre evoca nobres sentimentos nas pessoas que amam a sua pátria, coisa desconhecida pelos comunistas, internacionalistas e anti-patriotas por vocação.

Talvez pensasse no povo americano, nas pessoas cuja vida já está inevitavelmente entralaçada com a dele, nos homens e nas mulheres que conheceu durante a campanha – nos veteranos, nos esquecidos, nos desempregados, nos desesperançados, em todos aqueles que confiaram o seu voto e o seu futuro a ele. Talvez sentisse o peso da responsabilidade por toda essa gente e pela dura tarefa que tem pela frente: eliminar a sujeira comunista que há décadas tem contaminado a sua nação – uma sujeira que criou grossas camadas e lançou raízes profundas. Uma tarefa hercúlea, perante a qual mesmo o mais forte dos homens se sente diminuído.

Talvez uma mescla de tudo isso viesse à mente de Trump naquele instante.

Infelizmente, Trump não conhece a língua portuguesa. Se conhecesse, poderia perceber todo o significado do verso de Fernando Pessoa:

Aqui ao leme sou mais do que eu

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